Amizade a toda prova (Em 16/10/2012)

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          O texto narrativo “Coração híbrido” foi desenvolvido a partir de dois elementos previamente estipulados: as ações deveriam transcorrer durante o Natal e a temática deveria ser amizade.



    Coração Híbrido
    Al. Fontoura



           União soviética, 24 de dezembro de 1942, cidade de Stalingrad, ao sul de Moscow. O Major Maick Mordok, trinta e oito anos, ajustava seu paraquedas e cintos, a bordo de sua aeronave de caça P-51 MUSTANG, enquanto dividia seus pensamentos entre o planejamento da missão e a recordação de seus dias na Academia da Real Força Aérea Britânica à procura de explicações que o trouxeram até aquela guerra sem escrúpulos em que aeronaves decolavam e, por muitas vezes, não retornavam.
          Major Mordok, com suas dez mil horas de voo, sendo, destas, mil e quinhentas em combate, decola para mais uma missão de patrulhamento aéreo remoto com seu ala Tenente Richard Maingol, um jovem e promissor piloto de vinte e quatro anos cuja única opção foi a guerra.
            Conforme planejado, seu voo a oito mil pés lhes trazia uma visão privilegiada de todo o terreno; algumas nuvens cirros a dez mil pés encobriam parcialmente o sol. O silêncio no rádio, o marcador de combustível acusando tanques plenos e o ronco contínuo do motor V8 com 12 cilindros davam a sensação de segurança e tranquilidade, momento raro na rotina do Major, para o qual temporariamente a guerra parecia não existir; relembrava os voos que realizava com seu pai a bordo de aviões agrícolas no interior da Inglaterra.
            Num piscar de olhos, o silêncio é quebrado com inesperada rajada de ponto cinquenta (.50) de uma esquadrilha de aeronaves germânicas num mergulho descendente surgindo das traiçoeiras nuvens cirros. Tenente Maingol gritava ao rádio enquanto suas aeronaves eram rasgadas pelas traçantes, forçando Mordock e Maingol a ejetar sobre aquela área de conflito.
           Sem ainda acreditar no ocorrido, Mordock aterra em um lavoura de arroz, sem qualquer contato visual de seu ala. O frio não o fazia tremer mais do que a sensação de medo e incerteza causada pelas patrulhas alemãs caçando os sobreviventes das duas aeronaves abatidas. Suas orações ininterruptas não o pouparam do triste destino; sua consciência retirada com um golpe de coronha no pescoço parecia trazer o fim de um dos mais eficientes pilotos de caça da história. As dez mil horas de voo e sua extensa experiência não lhe traziam qualquer vantagem.
             A água gelada de uma caneca jogada em sua face traz para Mordock não só a consciência mas também a imagem de uma sala de interrogatório improvisada em um porão, com uma lâmpada incandescente fixada no teto, uma mesa de madeira a sua frente, seus braços amarrados ao descanso da cadeira. Quando seus olhos tentaram focalizar um homem bem fardado e com o peito cheio de medalhas no fundo da fria e úmida sala, lá veio outra coronhada.
         Os raios de sol de um novo dia acordam Mordock, que se encontra abandonado no último vagão de um trem de carga com destino a Moscow e com uma carta no bolso esquerdo de seu macacão. Sem entender aquilo tudo e tomado pela curiosidade, com a sua mão direita ele abre a carta, que dizia:
            “Bom-dia, Major Mordock! Que ironia do destino!
           Após quatro anos na Academia da Real Força Aérea Britânica, o meu sangue de pais alemães e minha criação no interior da Inglaterra me fizeram trocar de lado no conflito, mas não me esquecer do aluno Mordock, o melhor dos alunos e companheiro inseparável de alojamento.
          Um feliz Natal, caro amigo! 

        Observação: Não deixe de desamarrar o Tenente Maingol no vagão da frente!”

    25/12/1942 Cel Adolf Schereder