Evolução é ciência verdadeira; criacionismo é vã filosofia (Em 30/10/2013)


Paul Braterman


Prof. Braterman possui os diplomas de MA (1st cl. Hons), DPhil, DSc da University of Oxford, e passou sua carreira profissional na University of Glasgow e na University of North Texas, onde atuou como professor regente. No período em que esteve no Texas, entrou em contato com o criacionismo bíblico e observou seu impacto corrosivo sobre a educação científica. Trabalhou em questões de química relacionadas às origens da vida e às condições da Terra em suas origens e trabalha como consultor do Instituto de Astrobiologia da NASA. Atualmente é membro da comissão do British Centre for Science Education, cuja missão, em grande parte, é resistir à infiltração criacionista.
No texto a seguir, ele responde em nome da National Secular Society do Reino Unido, organização sem fins político-partidários com membros de todo o espectro social e político. Entre os sócios honorários dessa instituição estão incluídos Membros do Parlamento e seus pares, bem como as mais destacadas figuras da política, do jornalismo, do direito e das artes.


Evolução é ciência verdadeira; criacionismo é vã filosofia
Uma resposta para "O Evolucionismo e o Criacionismo à luz do Método Científico"
(Tradução: Carlos Alberto Babboni)

A Evolução não é uma cosmovisão opcional, mas uma teoria científica fundamental e uma das teorias científicas mais bem-sucedidas de todos os tempos.O Criacionismo bíblico também não é uma cosmovisão, mas um conjunto de crenças factualmente erradas a respeito do mundo e da Bíblia.

O Professor Vieira argumenta que a teoria atual da evolução e o criacionismo bíblico não são, na verdade, teorias rivais, mas representações de diferentes cosmovisões não testáveis, e que a diferença entre eles é mais filosófica do que científica. Ele está errado em todos os aspectos. A evolução é uma teoria científica, não apenas sobre o passado, mas também sobre os processos operacionais e observáveis no presente. A Evolução fez várias previsões bem-sucedidas e passou por muitos testes experimentais difíceis. Ela explica fatos que não poderiam nem mesmo ter sido imaginados quando, há 150 anos, a teoria foi apresentada em sua forma moderna. A história da criação do Gênesis pode ser testada através da observação, e [vê-se que é] falível. Faz declarações contrárias a fatos conhecidos, de modo que, independente da sua grande importância para nós, não podemos considerá-la como uma narrativa histórica exata.

O Professor Vieira afirma que não há nenhuma evidência científica para a evolução. Ele está errado. Dois excelentes livros que apresentam essa evidência, ambos disponíveis em Português, são A História De Quando Éramos Peixes, por Neil Shubin, e A Evidência da Evolução: porque é que Darwin tinha razão, da autoria de seu colega na Universidade de Chicago, Jerry Coyne. Há também um excelente site on-line, com centenas de referências à literatura primária, resumindo os principais argumentos; além disso novas descobertas que sustentam e ilustram o fato da evolução são relatadas todos os dias.

O livro de Shubin começa com um belo exemplo de evolução como uma teoria prognóstica. As rochas devonianas inferiores não contêm vertebrados terrestres. As rochas devonianas superiores contêm muitos. Portanto, a evolução prevê que deve haver evidência fóssil para formas intermediárias em alguma parte no período devoniano médio. Os primeiros vertebrados terrestres conhecidos são anfíbios, o que teria exigido a existência de água doce, e esse e outros argumentos detalhados sugeriram que as rochas com cerca de 375 milhões de anos, formadas em deltas de rios, seriam o melhor lugar para procurá-la (evidência fóssil). O professor Shubin e seus colegas montaram uma expedição a um local no Ártico canadense, onde tais rochas estavam expostas, e descobriram a forma intermediária prevista: um peixe com um pulso, o que eles chamaram Tiktaalik. Observe que, se essas rochas tivessem mostrado uma transição repentina sem intermediários, ou se elas estivessem cheias de coelhos, dinossauros, ou ossos de frango frito, isso teria refutado o relato evolutivo.

O livro de Coyne estabelece com muita clareza os fatos que são explicados pela evolução, todos eles exemplos de "evidências palpáveis" em prol da evolução, “que possam ser submetidas ao escrutínio do Método Científico”, cuja existência o erudito professor nega. Estas incluem: (a) a forma como as coisas vivas podem ser organizadas em famílias com base em sua anatomia, (b) abundantes formas fósseis (das quais Tiktaalik é um exemplo) mostrando como categorias biológicas diferentes são descendentes de um ancestral comum, (c) nosso conhecimento sobre como novas espécies surgem (o professor Coyne também é um dos autores do livro Speciation, mais técnico), (d) as árvores genealógicas deduzidas a partir de evidências de DNA, (e) o fato de que esses três métodos independentes - relação anatômica, registro de fósseis, e comparação de DNA – dão a mesma árvore, ou melhor, ramificação do arbusto, da vida, e (f) os exemplos de evolução que vemos ao nosso redor. Além disso, (g), podemos realizar e realizamos experimentos de laboratório que demonstram e elucidam a evolução, e (h) toda a reprodução vegetal e animal consiste em processos evolutivos atrelados aos nossos desejos, com a seleção artificial substituindo a seleção natural.

O professor Vieira apresenta dois tipos de justificativa para a sua afirmação de que a evolução não é ciência. Um deles é o fato de que ela não explica a origem da vida, do sistema solar, ou do universo. Mas isso não é um argumento real. A teoria atômica não explica a origem dos átomos, do sistema solar, ou do universo, mas ninguém duvida de que é uma teoria científica. A outra justificativa é que a evolução não explica a transformação das espécies do nível de Ordem para o nível de Família na Taxonomia Biológica aceita modernamente. Como vimos, isso não é verdade. O livro de Shubin, por exemplo, faz um relato muito claro da origem da transformação de peixes para anfíbios, e o livro A Beirad'Água, Macroevolução e a Transformação da Vida, de Carl Zimmer, descreve a transformação de mamíferos terrestres para baleias. Mas, mesmo se fosse verdade, a teoria não deve ser rejeitada apenas porque há coisas que ainda não podemos explicar. Perguntas não respondidas são tão essenciais para todos os tipos de ciência como respostas inquestionáveis são para alguns tipos de religião.

Quanto ao Criacionismo bíblico, este faz algumas reivindicações muito precisas e verificáveis. Ele afirma, por exemplo, (Gênesis 1:20 - 25), que os pássaros e baleias foram criados antes dos animais terrestres. Agora sabemos que as aves são descendentes dos dinossauros terrestres e que as baleias (artigo de revisão grátisaqui, e também o livro de Carl Zimmer mencionado acima) são descendentes de mamíferos terrestres. Portanto, temos de inferir que, se, como o professor Vieira acredita, Deus é responsável pelo conteúdo de Gênesis 1, Ele não tinha a intenção de que fosse usado como um livro de biologia. Observo, de passagem, que muitos cristãos, incluindo católicos, episcopais e metodistas, não têm nenhum problema com o fato da evolução e que somente os grupos evangélicos extremos, como adventistas do sétimo dia, ao qual o oprofessor Vieira pertence, consideram o Gênesis como um registro histórico literal.


Finalmente, isso tudo importa? Sim, para o passado do Brasil, presente e futuro. Em relação ao passado, a riqueza mineral do Brasil só pode ser entendida usando a ciência verdadeira, incluindo a evolução e sua companheira, a geoquímica de eras remotas. Por exemplo, as formações com camadas de ferro do Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais devem sua existência à liberação de oxigênio pela fotossíntese de bactérias há mais de dois bilhões de anos, e o petróleo e o gás da plataforma continental foram formados pela decomposição de organismos antigos no período cretáceo. O presente inclui a responsabilidade de gerir a bacia amazônica, algo que só pode ser feito com sabedoria, respeitando-se as relações evoluídas entre suas muitas espécies. E todos nós precisaremos de ciência real, e um reconhecimento da realidade científica, uma vez que a humanidade enfrenta seu futuro preocupante e instável.


Paul S. Braterman,
Professor Emeritus, University of North Texas
Honorary Senior Research Fellow in Chemistry, University of Glasgow
48 Nith Street, Glasgow G33 2AF, Scotland, UK


My first non-technical book, From Stars to Stalagmiteshttp://www.rsc.org/chemistryworld/2012/11/stars-stalagmites-everything-connects  

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