Da direita para a esquerda, Mauricio Murad,
o casal Marcelo e Daniella Menezes e seu filho Adriano
O sociólogo e escritor Mauricio Murad lançou seu mais recente livro na tarde do último sábado, 24 de outubro, na elegante livraria Mini Book Store, no Museu da República, no Rio de Janeiro. Histórias que meus filhos não me contaram – pequenas crônicas para pais e filhos entre o real e o ficcional brinda o leitor com narrativas ágeis, colhidas no cotidiano entre um pai e seus filhos, sempre alinhavadas pelo espírito investigativo e desinibidamente inquiridor das crianças, o que não raro resulta em situações cômicas, ainda que às vezes involuntárias. Mesmo com toda a presença do humor, o livro é uma reflexão sobre a importância em se estreitar o convívio entre pais e filhos, algo quase esquecido nos dias de hoje. O Letras esteve lá para conferir essa concorrida tarde de autógrafos e de quebra ainda conseguiu uma deliciosa entrevista com o simpático autor. Confira o bate-papo.
Letras –
O que motivou você a escrever essas crônicas de pais e filhos?
Mauricio
Murad – Na verdade são aquelas histórias que as
crianças, todas as crianças, pela criatividade delas, pela
espontaneidade, sempre falam, criam na nossa frente. Elas não nos
contam como histórias, mas a gente acaba ouvindo como histórias. E
são histórias de grande sabedoria, de grande questionamento, de
grandes ideias sobre a vida, sobre relacionamento entre pais e
filhos. Então eu fui juntando isso ao longo de vários anos e
resolvi escrever um livro de pequenas histórias, histórias curtas,
sem grande elaboração, mas que retratassem exatamente essa
atmosfera de afeto, de carinho, de espontaneidade, de originalidade
que as crianças têm, especialmente quando nos questionam e às
vezes nos deixam sem resposta. Então, eu digo para os meus filhos,
eles são coautores desse livro. Eles não me contaram essas
histórias, mas eu ouvi como histórias e estou agora repassando para
todo mundo como histórias.
Letras
– E o que lhe dá mais prazer: escrever artigos mais científicos,
sobre esportes, sociologia, ou crônicas?
M M –
O que me dá mais prazer é escrever sobre ficção. É escrever
crônicas, romances, contos, que eu já tenho... Esse é o meu sexto
livro na área de ficção. Eu gosto também muito da área da
pesquisa, do ensaio, do trabalho científico, mas a ficção é a que
eu acho que nos dá maior liberdade, maior criatividade e às vezes a
gente consegue, através da ficção, falar de uma maneira muito mais
profunda e um alcance muito maior do que o texto científico. Eu
realmente gosto muito mais da ficção.
Letras
– Todo escritor tem um desejo interno, uma espécie de inquietação,
de querer ver que alguma coisa da sua obra contribuiu numa mudança
de comportamento na sociedade. O senhor também tem esse sonho? E,
com esse livro, gostaria de ver algo transformado nas pessoas que o
lerem?
M M –
Olha, começando pelo final; com esse livro, eu gostaria ― como
e eu termino o livro dizendo isso ― que os pais, ao invés
de dar presentes para os filhos, dessem presenças; sentassem no
chão, ouvissem, conversassem, dialogassem, porque, se fizermos isso,
a gente contribui pra melhorar um pouquinho da
estupidez humana. Albert Einstein ― e está no livro
isso ― tem uma frase em que ele dizia: “Só há duas
coisas infinitas: o universo e a estupidez humana. E eu tenho dúvidas
em relação ao universo” (risos). Então, é genial! Então,
eu acho que, se a gente sentar com afeto, com carinho, ouvir,
relatar, trocar ideias com as crianças, em síntese, mais presença
do que presentes, a gente pode não resolver, mas melhorar um
pouquinho a estupidez humana. Esse é o meu sonho, com este livro,
contribuir um pouquinho, um pouquinho pra isso. E,
com a minha obra, eu tenho a alegria de ter iniciado na universidade
brasileira os estudos permanentes de sociologia do futebol, e eu acho
que isso contribuiu muito, especialmente pra denunciar
e combater a violência. Então, esse foi um sonho parcialmente
realizado e agora com esse [livro] eu pretendo que
seja um sonho, quem sabe também, mesmo que parcialmente, realizado.
Letras
– Então, podemos dizer que o público de seu novo livro são tanto
os pais, quanto os filhos.
M M –
Exatamente! São crônicas para pais e filhos. A intenção é
exatamente essa, que pais e filhos possam se encontrar nesse livro. É
isso que eu desejo.
Letras
– Aproveitando a oportunidade, já que o senhor é uma autoridade
nos assuntos esportivos, não poderíamos deixar de perguntar, sobre
as Olimpíadas de 2016, que impactos o senhor acredita que elas
poderão trazer às políticas de melhorias sociais e aos esportes em
geral no Brasil?
M M – Infelizmente
eu acho que nós estamos muito atrasados com aquilo que seria a coisa
mais importante dos jogos olímpicos, que seria o legado: o legado do
plano da segurança pública, o legado do plano da educação
esportiva integrada à educação geral das escolas, o legado em
termos de equipamentos esportivos comunitários... Infelizmente
estamos muito atrasados. Mas o que eu desejaria, mais do que a
vitória por medalhas, era esse legado, a herança que os jogos podem
deixar, em termos educacionais e sociais. Infelizmente, volto a
dizer, estamos atrasados e estamos deixando talvez passar uma nova
oportunidade, já que deixamos passar a Copa do Mundo também. Mas
isso seria mais importante do que os jogos, do que a competição, do
que o esporte, é o legado social, cultural, um pouco mais de
valores, de ética. Nós estamos no Brasil com as instituições
muito vazias de valores, de ideologias, de sentidos, de projetos, e
um grande evento desses deveria contribuir pra melhorar
as ações das nossas instituições. Eu gostaria que fosse isso. Mas
não tenho certeza se vamos conseguir.
Sobre o pensamento de Maurício Murad a respeito das torcidas organizadas, leia aqui no Letras A polêmica das torcidas organizadas.