Crie
uma narrativa em que o trecho seguinte seja inserido de forma
coerente:
Eu
não queria apenas sua amizade. Então fui até sua casa na hora
combinada e, assim que aporta se abriu, com o coração aos pulos,
declarei-lhe meu tão grande amor. E, depois de um longo silêncio,
ouvi de seus lábios uma revelação.
Hora
de dormir
Marcelo
Ferreira de Menezes
Como
todo bom carioca, eu sempre procurei manter a boa forma. Por isso,
tinha o hábito saudável de cuidar de meu corpo numa boa academia. A
que eu frequentava ficava em Copacabana, numa das avenidas mais
movimentadas do bairro. Naquele dia, eu queria chegar a um resultado
rápido e perceptível, por isso me esforcei bastante, chegando até
o meu limite, o que quase me levou a um overtraining.
Parei o treino imediatamente e, após uma ducha, decidi ir para
casa.
Na
rua, percebi que meu esforço, apesar de eu estar um pouco tonto ainda,
dera certo. Havia, do outro lado da avenida, na calçada oposta, uma
moça muito bonita, vestida com calças, camiseta e tênis brancos,
que me olhava fixamente e com certo interesse. Nossos olhares se
detiveram por instantes um no outro. Ela estava com uma prancheta à
mão e anotava algo com uma caneta. Imediatamente, pus-me a
atravessar a rua, na intenção de ir ter com ela, mas algo sólido e
grande roçou em meu peito com velocidade e força, atirando-me
bruscamente para trás e ao chão. Era um ônibus que passara com
toda a velocidade. Imediatamente e constrangido, coloquei-me de pé.
Fora só um susto; eu estava intacto felizmente. Então atravessei
logo em direção àquela encantadora moça.
Ela,
assim que me viu novamente, pareceu despertar de um transe e se pôs
a caminhar apressadamente, como se tivesse visto em mim um fantasma,
deixando cair a caneta. Aquela foi a minha deixa:
― Moça!
Ei, moça! Espere! Sua caneta! ― eu apertei o passo atrás dela,
tentando alcançá-la.
Finalmente
ela então parou:
― Olha...
O que você quer? Eu estou muito ocupada, com pressa ― disse com
olhos assustados, sem querer me encarar.
Eu
então tentei de tudo para conquistar sua simpatia, mas ela se
manteve o tempo todo na retaguarda. Eu não desistiria tão
facilmente.
― Então
só me diz o seu nome ― eu quase implorei.
― Helena.
Meu nome é Helena ― ela disse resignada.
Durante
quatro semanas, todos os dias, eu ficava aguardando sua passagem por
aquele ponto da avenida. E, sempre que a via, dava um jeito de puxar
assunto com Helena, que aos poucos foi cedendo às minhas investidas
e, em algumas ocasiões, até ria comigo e de minhas bobas artimanhas
para a fazer sorrir. Parecíamos estar virando bons amigos, e isso eu
não poderia deixar que acontecesse. Então, já apaixonado, insisti
para que ela me deixasse pegá-la em sua casa para um encontro.
Eu
não queria apenas sua amizade. Então fui até sua casa na hora
combinada e, assim que a porta se abriu, com o coração aos pulos,
declarei-lhe meu tão grande amor. E, depois de um longo silêncio,
ouvi de seus lábios uma revelação. Num gesto para mim inusitado, ela pegou a minha mão, dizendo pausadamente:
― Eu
entendo o que você está sentido. Até posso dizer que estou
sentindo o mesmo por você, mas tudo isso, por enquanto, é impossível.
― Por
quê? Você é casada? Noiva? Tem namorado? ― eu perguntava
atônito, atropelando as palavras.
― Não;
nada disso ― e apertou mais a minha mão.
― Então
o quê? Não me diga que está doente, pois eu não cairia em algo
assim, viu? ― eu ri.
― Não,
não estou doente. Você é quem está. Você está em coma.
Eu
quis rir no início, mas vi que ela estava séria. Ela então me
explicou tudo.
― Eu
vejo entre dois mundos; o nosso e aquele em que você está agora, em
coma.
― E
onde eu realmente estou?! E como isso foi me acontecer?! E quem é
você?! ― eu perguntei nervoso e ainda incrédulo.
― Bem,
eu sou sua enfermeira. Você está no seu leito, numa enfermaria de
hospital. E, pelo meu prontuário ― ela olhou para uma prancheta
que surgiu do nada em suas mãos ―, você foi atropelado por um
ônibus.
― E
o que os médicos dizem, Helena? Vou sobreviver? ― eu perguntei angustiado.
― As
chances são remotas segundo eles. Mas... tudo dependerá de sua
evolução ― respondeu-me
com ternura.
Seis
anos depois desses acontecimentos, minha vida estava completamente
mudada. Eu era outro. Uma voz veio de lá da cozinha, interrompendo
minha fala:
― Sofia!
Você toda noite pede para o papai contar essa mesma história. Já
está na hora de dormir. Ele está cansado e também precisa dormir.
Eu
respondi, rindo junto com Sofia, minha filha de quatro anos:
― Tudo
bem, Helena. Pode deixar. Eu não me importo. Esse anjinho aqui já
vai dormir ― e dei um beijo na testa de Sofia.
Eu
não me importava mesmo. Depois de tudo o que já havia acontecido
comigo e vendo como tudo terminara, eu não tinha mesmo nenhuma
pressa em voltar a dormir.